Estudo Bíblico Inocência Perdida
Traremos à tona ponderações sobre os interesses capitalistas que sustentam este mercado, as ideologias que sorrateiramente podem ser veiculadas por meio dos brinquedos, seus aspectos pedagógico, lúdico e cultural. Esperamos, com isso, poder, pelo menos, propiciar fundamentos para que possamos argumentar se temos ou não razões para suspeitar de algo tão inofensivo.
O brinquedo como promotor de lucro e ideologia
Contudo, uma coisa preocupa. Há certos brinquedos que podem estar sendo usados para recrutamento no terrorismo internacional. Na verdade, organizações do Oriente Médio e alguns grupos da Europa, da América Latina e da Ásia transformaram a rede mundial num dos mecanismos mais eficientes para disseminar suas ideologias, recrutar e treinar militantes. O videogame Special Force é um exemplo. Trata-se da simulação de um ataque às forças israelenses.
“É um jogo muito rastreado, pois incita o ódio aos judeus e foi criado especialmente para seduzir crianças e jovens”, disse Brian Jenkins, especialista em terror do centro de estudos Rand Corporation, sediado em Washington.
“a criança captura os conceitos transmitidos pelo brinquedo e os internaliza para, em seguida, personalizá-los. O seu imaginário realmente funciona como uma incubadora de idéias [...] Uma operação que representa atividade externa é reconstruída e começa a ocorrer internamente e um processo interpessoal é transformado num processo intrapessoal”.2
O que os brinquedos contemporâneos podem incutir na mente das crianças?
Philippe Ariès, em sua obra A história social da criança e da família, publicada em 1981, cita que
“em torno dos divertimentos mais naturais, com significado projetivo, como utilização de brinquedos, bonecas, soldadinhos, armas, rodas, que apareciam e desapareciam no decorrer das épocas, estavam representados os valores e concepções que desejavam passar e incutir nas crianças e adolescentes. Se por um lado as nações mais célebres, por seus artistas, artesãos, idealistas, propiciavam às crianças muitos brinquedos e divertimentos sadios, educativos, formadores; por outro, havia, porém, os brinquedos que não deixavam de ser os piores ‘lixos’ que poderiam ser oferecidos. Esta constatação também é feita por Cristina Von e pelo historiador Henri d’Allemagne. Concordam que os brinquedos aparecem como testemunhos modestos dos gostos, das realizações e das guerras de cada época.4 Infelizmente, os brinquedos atuais variam entre brados de guerra, morte, combate, prazer, consumo utilizado pelas crianças, passando pelos jogos eletrônicos utilizados pelos adolescentes e atingindo brinquedos eróticos e jogos nas estrelas utilizados pelos adultos. Em todos eles, está imbuído o desejo de destruir, alienar e consumir”.
A valorização do brinquedo, como fenômeno significativo e de amplo alcance na formação das mentes infantis e juvenis, bem como dentro da vida cultural das sociedades, é conquista recente. Assim como o livro infantil, diz a Dra. Nelly N. Coelho, da USP, o brinquedo é entendido como uma mensagem (comunicação) entre o autor/adulto (o que possui a experiência do real) e o leitor/criança (o que deve adquirir tal experiência). O que preocupa é qual tem sido o conteúdo dessa mensagem e como ele afeta a formação da criança, sua visão das coisas e sua relação com Deus (1Ts 5.21).5
A seguir, consideraremos alguns aspectos que envolvem os brinquedos e que poderão nos auxiliar a entender melhor a questão:
O aspecto pedagógico do brinquedo
O aspecto lúdico do brinquedo
“Sede sóbrios; vigiai; porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar” (1Pe 5.8).
O aspecto cultural do brinquedo
“O brinquedo é um elemento de profunda riqueza. À sua sombra, a sociedade se mostra duplamente: naquilo que é, mas, sobretudo naquilo que se dá a conhecer às crianças. Assim sendo, mostra as suas imagens que faz da infância. É um dos reveladores de nossa cultura. O brinquedo incorpora nossos conhecimentos sobre a criança, ou ao menos, as representações largamente difundidas, que circulam, as imagens que nossa sociedade é capaz de segregar” (1992).11
Roland Barthes diz que o brinquedo atual é a reprodução em miniatura de objetos para a criança como se ela fosse apenas um homem pequeno. Diz que o brinquedo industrializado é inteiramente socializado, constituído pelas coisas da vida adulta. Ele fornece um catálogo velhaco do que é parte do adulto, incluindo o “lixo tóxico” de valores antibíblicos. A criança é vista só como um consumidor. Pense: a mente de uma criança conceberia seres monstruosos, cruéis e assustadores com caricaturas “demonizadas”, sádicas, cheias de pavor e vingança? De onde ela tiraria a idéia de equipá-los com machados, punhais e porretes? Os bonecos, tazos, cards, eletrônicos e os games foram subvertidos. Quem faria um monstro mitológico de brinquedo? Aquela coisinha com chifres, garras afiadas, dentes vampirescos, olhos famintos e sinistros com aquela expressão diabólica, sendo levado de um lado para o outro pela criança! Esses brinquedos, vulgares, usando a expressão de Roland Barthes, são essencialmente um microcosmo adulto.12 Se fossem feitos pela criança, seriam a expressão do imaginário infantil e não um atentado a ele. E aqui está o problema. O brinquedo não é neutro. Ele carrega traços da imaginação de um projetista, que, mesmo sendo brilhante, corre o risco de ser diabólica. A Bíblia alerta que
“este tipo de sabedoria não vem dos céus, mas é terrena; não é espiritual, mas é demoníaca” (Tg 3.15 – NVI).
Conclusão: se a violência, o erotismo, o ocultismo, a feitiçaria ou o anarquismo e o grotesco são parte de uma cultura reproduzida de forma inadequada em brinquedos, podem constituir-se, de fato, num risco real à formação da criança (Dt 18.9-11).
A emancipação e a contaminação do brinquedo
C. S. Lewis observa que
“o prazer e a matéria são campos exclusivos de Deus, tudo o que está ao alcance do mal é a distorção dos canais naturais previstos por Deus para a realização do prazer”.14
O perigo do paganismo e do ocultismo
“um imaginário preexistente criado pelos desenhos animados, seriados televisivos, mundo da ficção científica com motores e robôs, mundo encantado dos contos de fadas, histórias de piratas, índios e bandidos. Ao representar realidades imaginárias, os brinquedos expressam, preferencialmente, personagens sob formas de bonecos, como manequins articulados ou super-heróis, misto de homens, animais, máquinas, monstros”,15
e acrescentamos, até entidades religiosas.O boneco é a materialização do personagem originado na imaginação ou na vida real. Por meio dele, este personagem, bom ou ruim, passa a existir num plano, elevação e perfil. O boneco traz o imaginário à existência, com peso, volume, medida e cheiro, com forma no tempo e no espaço. Assim, personagens como o Superman, o Batman, o Homem-aranha, Hellboy, Hulk e outros super-heróis clássicos podem ser encontrados nas mãos das crianças em todo o lugar. Naturalmente, nem todos os bonecos possuem uma conotação negativa. Contudo, o tipo de valores que ele comunicar, conclusivamente, influenciará a formação da criança. Para Umberto Eco, as imagens míticas (super-heróis), reproduzidas em brinquedos, são criadas e difundidas pelos chamados persuasores ocultos com o objetivo de enraizá-las na sensibilidade da pessoa. Há “uma persuasão oculta motivada por fins econômicos determinados”.16 O boneco é um cristalizador dessa cultura.
Larry McClain afirma que certas criaturas, retratadas em alguns bonecos, que aparecem na arqueologia e na mitologia, não são apenas fruto da imaginação carnal (Sl 38.12, 64.6; Pv 16.30, 23.7; Mq 2.1; At 17.29). Ao contrário, eram, literalmente, entidades demoníacas que surgiram nas civilizações do passado. Esses tipos obscuros, ou esses seres demoníacos, eram representados como parte homem e parte animal em suas características, como o pássaro-homem dos assírios, por exemplo. Os seres retratados são sinistros, com faces contorcidas e caretas demoníacas.17
Se você encontrar garras ou chifres, cauda flechada ou tridente em algum dos seus bonecos, sem dúvida o fogo lhes faria muito bem, já que o inferno é o lugar de origem deles, apesar de ponderarmos que estes traços estéticos sejam frutos do imaginário popular ao longo dos séculos, nas diversas culturas, pois não temos base bíblica para detalharmos a exata forma e peculiaridades dos anjos caídos.
• Bonecos pagãos
“Eles podem ser criaturas parte cavalo e parte homem, peixe e homem, como o deus Dagom, dos filisteus, parte jaguar e parte homem, com a língua pendente sobre o queixo, que é o símbolo universal da possessão demoníaca. Uma das combinações é a do homem-serpente”.
• Cards pagãos
Pense. Por que diversos brinquedos estão estranhamente impregnados desses conceitos religiosos se o seu propósito deveria ser apenas divertir a criança? Se os brinquedos, segundo Guilles Brougère, são suportes de representações, por que idéias sutis do xintoísmo (mangás), do zen-budismo (Matrix) e da Nova Era (Star Wars) são usadas para inspirar heróis e confeccioná-los? Não seria uma estratégia de incutir estas crenças na mente das crianças (2Co 11.14)? Nicolas Montigneaux defende que o personagem funciona como um espelho que envia à criança uma imagem dupla: a da própria criança e a desejável, com a qual a criança quererá se parecer ou da qual sonhará em se aproximar. O personagem assume, portanto, o lugar de modelo de aspiração porque constitui uma ponte entre o presente da criança e o seu futuro adulto.19
• Super-heróis suspeitos
“em muitos livros de ficção infantis e desenhos animados de hoje (Pokémon, Transformers, Cavaleiros do Zodíaco, etc.), super-heróis que inspiram brinquedos, sem falar nos jogos eletrônicos, ou em Magic, o bem e o mal se opõem diametralmente ou, então, se misturam, chegando quase a ponto de inverter sua polaridade”.21
“As personagens podem ser reais (humanas) ou simbólicas (bichos, plantas), mas sempre com traços de caráter ou comportamento bem nítidos. Isto é, com limites precisos entre bons e maus, fortes e fracos, belos e feios, etc. Mais tarde, a ambigüidade das realidades será descoberta [...] Mas nesse momento, já terão assimilado parâmetros para julgamento”.22
Gabriele Greggersen afirma que
“o bem é muitas vezes visto como algo ingênuo, inofensivo e afeminado. Eis por que o mal, o bruxo e o feiticeiro acabam sendo mais atraentes”. “O sobrenaturalismo típico dos programas infantis promove o relativismo, uma força ou poder neutro que pode ser usado para o bem ou para o mal”.
“a teoria íntegra do valor [...] exige que o bem seja original e o mal, mera perversão; que o bem seja a árvore, e o mal seja a hera; que o bem seja capaz de perceber o mal (como quando homens sãos percebem a loucura), enquanto o mal não pode fazer o mesmo...”.
Os games e as imagens grotescas
“raciocina espontaneamente de maneira analógica. As imagens integram a estruturação não só do pensamento como também da sua vida emocional”.
Crianças em perigo
“Examinai tudo. Retende o bem. Abstende-vos de toda a aparência do mal. E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso SENHOR Jesus Cristo”. (1Ts 5.21-23).
É preciso proteger a criança de conteúdos danosos à sua infância:
“Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida” (Pv 4.23. V. tb. Sl 119.37).
“E estas palavras, que hoje te ordeno, estarão no teu coração; e as ensinarás a teus filhos e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e deitando-te e levantando-te (Dt 6.6,7. V. tb. Pv 29.15; 22.6; Sl 127.3).
Dicas para escolher brinquedos e proteger nossas crianças
- Leia as instruções que acompanham o brinquedo. Você ficará surpreso com o que vai encontrar! Procure identificar associações com conteúdos que podem ser prejudiciais à criança.
- Tente conhecer o personagem representado no brinquedo. O brinquedo é apenas o seu suporte físico. Que tipo de acessórios possui? São heróis, vilões, deuses? O que podem transmitir à criança?
- Não veja demônios em tudo, use a Bíblia e o bom senso. A Bíblia é a bússola para auxiliá-lo na avaliação do conteúdo cultural nocivo:
Este estudo apenas alerta sobre os conteúdos inadequados, sem excluir o brinquedo, que pode ser santificado como fonte de lazer (1Ts 5.21-22). O pacto de Lausane defende que o evangelho nunca é hóspede de qualquer cultura; sempre é seu juiz e redentor. O evangelho avalia o conteúdo cultural, inclusive o que está embutido no brinquedo, de acordo com seus próprios critérios de verdade e justiça, e insiste nos absolutos morais em cada cultura.
A confissão de Westminster orienta que
“todo o conselho de Deus concernente a todas as coisas necessárias para a glória dele e para a salvação, fé e vida do homem, ou é expressamente declarado na Escritura ou pode ser lógica e claramente deduzido dela”.
Textos bíblicos que podem ajudar na avaliação de conteúdos ocultos em alguns brinquedos
- Bruxaria – Lv 19.31; Is 8.19-22; Ez 13.18-21; 21.21-24; Ap 18.23.
- Demônios – Mc 1.34; 5.5; Lc 10.17; At 16.16-18; 2Co 11.13,14; Ef 6.12.
- Deuses ou seres mitológicos – Êx 10.2-6; 32.4-10; Dt 4.23,24; 5.6,7; Is 42.8.
- Imagens grotescas – Sl 101.2-7; Ez 8.9-10; Mt 6.22,23; Fp 4.8.
- O mal – Jó 4.8; Sl 19.13; 26.5; Rm 1.24-28; Gl 5.16,17; Ef 4.22; 6.12.
- Objetos ligados ao ocultismo – Ez 13.18-23; At 19.19; Dt 7.26,27.
- Ocultismo – Dt 4.8; Ez 13.18-23; 21.21-24; Is 65.3,4; At 13.8-10; 19.19.
- Poder – Ec 9.11; Pv 21.31; Zc 4.6; Mt 5.1-12; Rm 12.19; 1Jo 2.6.
- Violência – Sl 37.17; 75.10; 140.11; Pv 3.31; 16.29; 21.7; Is 13.11.
Notas:
1 Veja. 21 de julho, 2004. p. 111.2 Citado por SOUZA, Solange e Jobim. Infância e linguagem, Bankhtin, Vygotsky e Benjamim.Campinas: Papirus, 1994, p. 125-6.
3 FEILITZEN, Cecília Von e CARLSON, Ulla. A criança e a violência na mídia. São Paulo: Cortez e UNESCO, 2002, p. 11-3.
4 VON, Cristina. A história do brinquedo. São Paulo, Alegro, 2001.
5 COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil. São Paulo: Ed. Moderna, 2000, p. 30-1.
6 GUILLES, Brougère. In: Études et Documents, n. 2: 1989-1990. Paris: Université, Paris-Nord\Département des Sciences du Jeu, p. 9.
7 OLIVEIRA, Paulo de Salles. O que é brinquedo. São Paulo: Brasiliense, 1984, p. 42-3.
8 JONES, Gerard. Brincando de Matar Monstros. São Paulo: Conrad, 2004, p. 298.
9 LEBOVIC, S. Lebovici e DIATKINE, R. Significado e função do brinquedo. Porto Alegre: Artmed, p. 63.
10 Consulte as seguintes obras:
SANTOS, Santa Marli P. Org. A ludicidade como ciência. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 226.
SANTOS, Santa Marli P. Brinquedoteca, o lúdico em diferentes contextos. Petrópolis: Vozes, 1997, p. 141.
SANTOS, Santa Marli P. Org. A ludicidade como ciência. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 226.
KISHIMOTO, Tizuko Morchida. Org. Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 2002, p. 183.
ALVES, Rubem. O enigma da religião. Campinas, Papirus, 1984, p. 120.
VYGOTSKY. S. A Formação da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p.126.
HUIZINGA, Johan. Homo ludens. São Paulo: Perspectiva, 2004, p. 3,4.
11 GUILLES, Brougère. Cit., p. 7 . GUILLES, Brougère. In: Études et Documents, n. 2: 1989-1990. Paris: Université,
Paris-Nord\Département des Sciences du Jeu, p. 9.
12 BARTHES, Roland. Mitologias. Rio de Janeiro: Difel, 2003, p.59-60.
13 BENJAMIN, Walter. Reflexões Sobre a Criança, o Brinquedo e a Educação. São Paulo: Duas Cidades, Ed 34, 2002, p. 91-2.
14 LEWIS, C. S. Cartas do diabo ao seu aprendiz. Petrópolis, Vozes.
15 SANTOS, Santa Marli Pires dos. Brinquedo e infância. Petrópolis: Vozes, 1999.
16 Consulte as seguintes obras:
KISHIMOTO, T. M. Citado em O brincar e suas teorias. São Paulo: Pioneira, 2002, p.28.
ECO, HUMBERTO. Apocalípticos e integrados. São Paulo: Perspectiva, 2002, p. 243-6.
17 JEREMIAH, David e CARLSON, C.C. A invasão de deuses estranhos. São Paulo: Quadrangular, 1995, p. 95-6.
18 SCHAEFFER, Francis A. O Deus que intervém. Refúgio ed. 1985.
19 MONTIGNEAUX, N. Público-alvo: crianças. Rio de Janeiro: Ed. Negócio, 2003.
20 BETTELHEIM, Bruno. Uma vida para seu filho. São Paulo: Ed. Campus, p. 184.
21 GREGGERSEN, Gabriele. O Senhor dos anéis. Viçosa, ULTIMATO, 2003, p. 76.
22 COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil. São Paulo, Moderna, 2000, p. 35.
23 LEWIS, C. S. Cristianismo puro e simples. São Paulo: ABU, 1985, p. 49. e Op. Cit. p. 99.
Autor: Édino Luiz de Melo